domingo, 16 de agosto de 2015

Rosto congelado

  Já é a centésima vez que você acorda e se olha no espelho com uma expressão que você não conhece. Sabe o quanto dói se olhar e não se conhecer? Cadê aquelas perguntas que hoje já não se tem resposta nenhuma. (O que eu quero? O que eu estou fazendo? Minha vivência tem algum rumo?). Onde estas perguntas foram parar? Bom, você pode brincar com o fato de fazer uma dessas perguntas só pra sentir a angústia subindo e cortando tudo. E a paranoia . Você pode brincar de sentir medo, e eu sei que você sabe fazer isso. Como ninguém.
   
     Como ninguém você consegue demonizar os seus medos, destruir toda e qualquer estrutura a sua frente, gerar ambientes que te assustam e te fazem pensar que não há mais volta. Independente da questão, se é uma questão social, se é uma questão do indivíduo  ou se é uma questão que na verdade não existe. Pode ser apenas um fruto da sua mente, você vai denegrir, você irá enxergar de forma negativa. Quando tudo é negativo dentro do mundo que você mesmo criou, mas agora a melancolia flui com uma doçura que é impossível de explicar. Eu nunca tinha experimentado algo tão doce. Mesmo falando sobre a minha tristeza, eu gosto quando ela é doce. Eu gosto quando não é fruto do medo, eu gosto quando ela é lenta e processual. Eu não gosto quando ela me assusta, eu gosto quando ela toca lugares frágeis. Eu não gosto quando ela é um excesso de ódio. Eu gosto quando ela é apenas uma dor isolada e leve. Gritando baixinho no meu ouvido.


E o vidro do espelho

E as ruas do centro a noite

Aqueles que dormem na rua gelada

Aqueles que congelam seus rostos paralisados em vistas intermináveis


E o vidro do espelho

E as ruas do centro pela manhã, juntamente com o coletivo veloz

O barulho dos carros e a máquina do trabalho operacional sobre a sua cabeça

Mas voltando as ruas do centro a noite, onde o barulho se esconde

Onde a dor se sente livre para fluir, voar, seguir como um rio.

Eu penso que todas as pessoas escondem uma dor muito grande por trás dos rostos programáveis. Por trás dos rostos fictícios. Uma dor que iria fazer a cidade entrar em tempestade permanente. E o espelho que não para de refletir um rosto desconhecido num ambiente em que não há mais saídas.

E o vidro do espelho

E as ruas do centro a noite...




A morte gelada. O seu corpo gelado. A sua vida gelada.

A sua mente devorada.


E as ruas do centro a noite...

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